terça-feira, 3 de julho de 2012

Banana Boat

Daylight come and me wan' go home
Um caiaque de quase 4,5m, mesmo sendo leve, não é uma coisa fácil de transportar. O custo em dinhero e emissão de carbono tende a ser desproporcionalmente alto em relação a seus menos de 30kg. Meus amigos do Grupo Pé no Mato resolveram o problema me conseguindo uma carona em um caminhão que iria a São Paulo descarregar bananas e voltaria vazio, naquela mesma noite, para Eldorado. Providenciei um carreto para levar o barco da Billings para o CEASA. Cheguei lá no fim da tarde, coloquei o caiaque amarelo num armazém de bananas e enquanto esperava fiquei pensando no quanto ele e elas eram parecidos.
O caminhão se atrasou e quando finalmente partimos já eram quase 23:00h. Percorremos os 260km com uma parada para um café e por volta das 3:00 cruzávamos as ruas vazias de Eldorado. Paramos em frente ao hotel e escalei a pilha de engradados vazios para descer de lá o caiaque. O recepcionista sonolento arregalou os olhos quando pedi que abrisse a porta da garagem para guardar um barco. Uma manhã movimentada se aproximava e eu precisava dormir.
A viagem estava começando.



(continua no próximo post)

domingo, 1 de julho de 2012

De volta á Ribeira


O quilombola Ditão em sua canoa.
Já se vão quase 15 anos desde minhas primeiras remadas no Vale do Ribeira. A companhia de antigos e novos amigos compartilhando aventuras, o contato intenso com a natureza e a beleza da paisagem tornaram aqueles dias muito agradáveis. Estes já eram motivos mais que suficientes para estar ali mas durante aquelas incursões pelos Rios Juquiá e Ribeira de Iguape, tomei contato com embarcações que me impressionaram. Apesar da proximidade com o Mar Pequeno não pareciam ter qualquer semelhança com as canoas tipicamente caiçaras desta outra região. Estas últimas, com as quais eu estava mais familiarizado, tinham suas formas perfeitamente adaptadas às águas agitadas por ondas. As do Ribeira pareciam mais rústicas e primitivas mas, ainda assim, adequadas ao uso nas correntezas dos rios como ficaria demonstrado mais tarde. Ao longo dos anos que se seguiram tentei, por diversas vezes e sem sucesso, conseguir informações sobre aquelas magníficas canoas entalhadas em troncos de árvores. Seria interessante compará-las com as canoas caiçaras. Teria que voltar ao vale com tempo para percorrer os rios, visitar comunidades, conversar com pessoas, navegar com elas em seus barcos e para isso idealizei uma expedição em que partiria de Eldorado remando pelo Ribeira até Iguape e de lá seguiria pelo Mar Pequeno até Cananeia. Há dois anos a oportunidade parecia ter surgido. Com o apoio de dois grandes amigos conhecedores da região, o velejador Ubirajara Proença e o canoista Lélis Ribeiro, fiz duas visitas de reconhecimento e preparação mas, depois de vários atrasos, a estação das chuvas estava se aproximando e eu não podia deixar que aquela janela se fechasse sem, pelo menos, iniciar minha tão sonhada viagem pelo Ribeira e Mar Pequeno.
Quase nada sairia como planejado mas, ao fim de alguns dias, eu estaria ainda mais fascinado e entusiasmado com o projeto.
(continua no próximo post)

quinta-feira, 28 de junho de 2012

A Peleja da Canoa de Tolda contra a Amnésia Cultural


A Luzitânia com suas caranguejas e bolinas de contrabordo

Se necessitar de heróis é ruim, necessitar e não os ter seria pior. Alguns deles estão reunidos na Canoa de Tolda cuidando das tradições do Baixo São Francisco e da preciosa “Luzitânia” que, em breve, estará com nova mastreação.
A embarcação, tombada pelo IPHAN, é uma das mais antigas entre as que navagam no Baixo São Francisco.
Cliquem no link para visitar o site e desculpem a omissão mas ainda não tenho o nome do autor da foto.

domingo, 22 de abril de 2012

Do que hei de falar começo e digo.

A mais bela certidão de nascimento
que já se lavrou para um país!

Posto que o Capitão-mor desta vossa frota, e assim os outros capitães escrevam a Vossa Alteza a nova do achamento desta vossa terra nova, que nesta navegação agora se achou, não deixarei também de dar minha conta disso a Vossa Alteza, o melhor que eu puder, ainda que - para o bem contar e falar -, o saiba fazer pior que todos.

Tome Vossa Alteza, porém, minha ignorância por boa vontade, e creia bem por certo que, para alindar nem afear, não porei aqui mais do que aquilo que vi e me pareceu.

Da mafinhagem e singraduras do caminho não darei aqui conta a Vossa Alteza, porque o não saberei fazer, e os pilotos devem ter esse cuidado. Portanto, Senhor, do que hei de falar começo e digo.
(... )
 Deste Porto Seguro, da Vossa Ilha de Vera Cruz, hoje, sexta-feira, primeiro dia de maio de 1500.
Pero Vaz de Caminha

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Amigos (8)

Confraternização no içamento das velas que marca o primeiro dia do Encontro..
Com este post se encerra a materia sobre o X Encontro de Embarcações Tradicionais da Galícia. O início está em É pau, é pedra, é o Finisterre...(1)

Tive contato com pescadores e aquicultores, com o diretor de um museu, com o dono de uma veleria, com o dono de um estaleiro e presidente da associação dos estaleiros, com uma linguista brasileira que estuda o idioma galego e muitos amantes dos barcos e da marinharia tradicional. Conversamos sobre embarcações galegas, sobre o trabalho de preservação e valorização deste patrimônio cultural. Alguns me surpreenderam com seu interesse e conhecimento a respeito de embarcações brasileiras como saveiros e jangadas. A todos sou grato por sua generosidade e espero te-los sempre como amigos. Por hora, peço licença para citar apenas dois:
Marcelino Albuin no
Illa de Cortegada.
Marcelino Albuín, historiador dedicado à pesquisa e preservação de patrimônio cultural, me deu um grande apoio apesar de estar sempre ocupado com as atividades do Encontro.
Quando penso num personagem símbolo do encontro ele é sem dúvida Uxio Allo, um empresário aquicultor com atuação apaixonada no resgate e preservação das embarções e da cultura marinheira da Galicia. Ele me disse ter nascido em um barco e não me preocupei em checar porque entendi que a afirmação pairava acima da mera verdade factual. Outros podem ter trabalhado tanto quanto ele mas, certamente, ninguém se divertiu tanto! No segundo dia brinquei com ele: Toda vez que eu aponto a câmera na direção de uma gaita de fole você sai na foto. E ele me respondeu rindo: “Você não pode mostrar estas fotos. Eu disse para minha família que este seria um encontro sério”!
Uxio Allo recolhendo a vela do Nova Marina.
foto: Felipe Egito Vellez

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Identidade (7)


Movidos pelo vento e pela música.

Respondendo à pergunta do fim do post anterior, pude ver que há um aspecto que torna tudo isso possível: uma profunda consciência de que esta rica cultura marinheira é parte essencial da identidade de pessoas e comunidades. O Encontro é, antes de tudo, uma alegre celebração da Nacionalidade Galega. O som das gaitas de fole e das “panderetas” tem um efeito mágico de reunir esse povo e a música tradicional está presente em todos os momentos.
Sem qualquer traço da arrogância que costuma permear eventos de inspiração nacionalista, estes galegos recebem com muito carinho os que vem de outros lugares, não só para ver mas também para mostrar seus barcos e suas culturas, compartilhando conhecimentos e emoções.
Coordenado pela “Federación Galega pola Cultura Marítima e Fluvial”, o encontro acontece a cada dois anos em um porto diferente da Galícia. Nesta edição tiveram papel importante a “Asociación Cultural Depotiva Rompetimóns de Carril” e principalmente o povo desta vila.

...portugueses.

Espanhóis e...

Bascos e...




...catalães.


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quinta-feira, 12 de abril de 2012

Pessoas (6)

vídeo de: Felipe Egito Vellez

Talvez minha única frustração tenha sido constatar que não há uma fórmula ou modelo de negócio que possamos importar. Chega a causar surpresa o fato de não existir por trás do evento nenhuma mega empresa de promoções gerindo altas verbas incentivadas. Também não vi nenhuma grande corporação colocando sua marca nas velas e costados dos barcos e nem mesmo o apadrinhamento ostensivo de políticos fisiológicos com objetivos eleitoreiros.

 As verbas, de origem estatal e privada, são relativamente pequenas e a administração e várias atividades operacionais do Encontro são realizadas através de trabalho voluntário. Pescadores e aquicultores com seus barcos dão apoio às velejadas e transportam fotógrafos e cinegrafistas. Não há assessoria de imprensa nem press releases mas todos se esforçam para fornecer qualquer informação ou providenciam um contato com a pessoa mais indicada e as conversas são sempre agradáveis e entusiasmadas. Pode parecer pouco profissional mas o resultado é excelente. Além das informações objetivas, a experiência humana que se produz é muito enriquecedora. Mas o que motiva essas pessoas?

Boa comida e
ótimo convívio.
A viagem começa...
Aqui ainda se
vive do mar.

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